terça-feira, 15 de novembro de 2016

Esboço da Pesquisa: O marketing como mediador entre o público e o espetáculo teatral

“as artes não são nem um bem consumível, nem um serviço; fazem parte de um contrato" (PICK apud DOMINGOS, 2010, p. 8)

APRESENTAÇÃO

Existe receita que garanta público nos espetáculos?

Em 2003, a convite de um colega de escola, decidi entrar para o grupo de teatro e nunca mais saí. Passei a "consumir" teatro como espectador e como ator, desde então. Antes disso, o teatro me chamava pouca atenção. Foi preciso um convite, um "boca-a-boca" para despertar meu interesse de ir ao teatro. Sabe por que eu não tinha interesse pelo teatro? Porque eu não o conhecia. O teatro não fazia parte da minha cultura nem a da minha família.
Já no grupo de teatro, nosso primeiro desafio: montar uma peça para participar de um festival de teatro na escola e levar público à sessão. Pensamos em várias estratégias, começando com o tradicional convite aos amigos mais próximos. Mas não era o suficiente. Precisávamos lotar um teatro com mais de quinhentos lugares. Como não tínhamos dinheiro, partimos então, sem saber, para uma estratégia de marketing guerrilha. Elaboramos um esquete, que era na verdade uma cena chave da peça, e fomos de sala em sala apresentando esta cena. Ao final, fazíamos o convite a todos os alunos para ir nos assistir no teatro. Além disso, elaboramos um painel no saguão, próximo à cantina - área com bastante circulação de alunos - com colagens de objetos que remetiam ao enredo do espetáculo. Resultado: sessão lotada e prêmio de Melhor Espetáculo de Acordo com o Júri Popular no festival.
A quantidade de pessoas no dia da peça, o prêmio da escola do público no festival, sem dúvida, sem que soubéssemos à época, foi resultado de um plano de comunicação publicitária. Desde então, entendi que o marketing é um mediador entre o público e o espetáculo teatral. O marketing e suas ferramentas de divulgação, na maioria das vezes, chega primeiro no público do que o espetáculo em si. Cabe à publicidade o convencimento e a efetivação do "contrato" entre público e obra.

O desafio que as organizações e os marketeers culturais enfrentam é o de “tornar um produto cultural num objecto de desejo e fazê-lo chegar às pessoas que nunca o procurariam”, escolhendo, para tal, os meios que mais retorno possam trazer à instituição. (MÂNTUA apud DOMINGOS, 2010, p. 5)

Quando cheguei na idade de prestar vestibular, optei por estudar "Comunicação Social" com habilitação em "Publicidade e Propaganda". Na verdade, foi o curso disponível em meu estado, Mato Grosso, que acreditei ser o mais próximo das artes cênicas.
Formei-me em Publicidade, trabalhei em algumas agências de propaganda, trabalhei com marketing político e até em comunicação institucional de órgão público. Porém, sempre buscando aliar meu emprego formal com meu trabalho no teatro, aperfeiçoando as técnicas de marketing para informar e convencer o público a ir ao teatro assistir meus espetáculos.
A questão inicial desse trabalho nasce dessa minha experiência com ambas as áreas, aliada ao fato de que não há receita que garanta público no teatro, mas acredito ser possível utilizar as ferramentas do marketing, em especial da publicidade, para converter público alvo em vendas de ingressos. Essa questão é ainda mais vital quando os grupos dependem da bilheteria de seus espetáculo, como é o caso do meu grupo de teatro, o Pessoal do Ânima.

Objetivos

Este trabalho pretende, além de conceituar e traçar estratégias que possam servir de esteio para grupos de teatro, produtores culturais e interessados, realizar um estudo de caso da estratégia de divulgação do espetáculo do "Segredos de Liquidificador" do grupo Pessoal do Ânima.

Metodologia

Primeiramente, fiz uma pesquisa conceitual acerca dos termos "marketing", "mediação", "publicidade" e "teatro".
Essa pesquisa de cunho exploratório se apoiou em análises documentais, bibliográficas, incluindo artigos de internet, buscando sistematizar o assunto desenvolvido por outros autores de forma a atingir os objetivos propostos.
A etapa seguinte será analisar as estratégias de divulgação do espetáculo "Segredos de Liquidificador" do grupo Pessoal do Ânima e procurar mensurar resultado por meio de uma pesquisa direta, por meio de formulário aplicado ao público do espetáculo nos dias de sessão.

O espetáculo Segredos de Liquidificador

Segredos de Liquidificador é um espetáculo de humor, no estilo "esquetes" que teve sua estreia em 2006. O espetáculo atualmente é o carro-chefe do grupo mato-grossense Pessoal do Ânima.
O formato é simples: sem cenário, apenas uma arara de figurinos exposta no centro do palco, os atores de cara limpa e roupas pretas, sentadas em frente à audiência, revezam personagens de humor que tratam de situações que vão do cotidiano ao excêntrico.
O espetáculo nasceu em um momento de dificuldades para o grupo. Momento em que uma cisão interna deixou o grupo com poucos integrantes e pouco recurso. Sendo assim, os idealizadores da peça tiveram a ideia de realizar um espetáculo composto pelos esquetes curtos que realizavam em suas oficinas experimentais de teatro. Os figurinos eram sobras de espetáculos antigos do grupo, que entulhavam o espaço de ensaio.
A primeira sessão foi de graça, do teatro da escola, e o grupo com receio de estar apresentando algo inacabado, chamou a sessão de ensaio aberto. O sucesso foi tanto que o espetáculo passou a ser um divisor de águas no grupo, que deixou de ser quase que exclusivamente um grupo de escola para se firmar no cenário das artes cênicas mato-grossense. Hoje, o grupo é independente, tendo se apresentado em todos os principais teatros do estado e até fora dele.
O espetáculo foi o primeiro no estado a gravar "teasers" promocionais, os famosos virais, e utilizá-los nas redes sociais como estratégia de divulgação.
O espetáculo está há mais de um ano sem entrar em temporada e o grupo planeja uma temporada especial para comemorar os dez anos da peça. Por isso, aproveitando a oportunidade, realizarei um estudo de caso sobre a estratégia de divulgação que o grupo irá realizar junto a sua equipe de marketing. Documentarei essa estratégia e buscarei mensurar resultado por meio de formulários junto à plateia nos dias de espetáculo, buscando saber deles por quais meios ficou sabendo do evento. Esse formulário traçará um panorama da assertividade da estratégia publicitária do espetáculo.

O grupo de teatro Pessoal do Ânima

O Pessoal do Ânima foi fundado na então Escola Técnica Federal de Mato Grosso em 1987 por Gilberto Nasser e sua atual formação surgiu em 2003, durante o 6° Fest Ânima – Festival de Teatro do IFMT (antiga Escola Técnica), com a peça "Hã, alienada, eu?!", recebendo os prêmios de melhor espetáculo do júri popular e melhor criatividade.
A atual formação idealizou comédia “Segredos de liquidificador” em 2006 e o musical "As Bruxas de Oz" em 2013. adaptado do livro clássico "O Maravilhoso Mágico de Oz" pelo próprio grupo.
Ao longo de sua fundação, o Pessoal do Ânima já contabilizou mais de cinquenta espetáculos, entre adaptações e textos originais. O grupo é conhecido no estado por ser um celeiro de talentos, revelando grandes nomes das artes regional, como André D'Lucca, Sandro Lucose, J. Astrevo, Lioniê Vitório entre outros.
Atualmente, o grupo é independente, não mantendo mais nenhum vínculo com a Escola Técnica (atualmente IFMT). O grupo tem se tornado bastante popular por seus espetáculos de humor e seus musicais infanto juvenis.
A comédia é um traço marcante do Pessoal do Ânima, sobretudo o espetáculo "Segredos de Liquidificador" que satiriza os "tipos" sociais da região, dando vida a personagens icônicos como a sexóloga Penélope Pê, a socialite Liegy, o pescador Xô Dito, a menina Janayara e até mesmo a versão escrachada da Chapeuzinho Vermelho.

 Mas afinal, o que é marketing?

O marketing pode ser entendido como o conjunto de estratégias de venda de bens ou serviços ao público final. Isso implica dizer que, no teatro, marketing envolve tudo, desde a "arte" do espetáculo até o preço do ingresso.
Para um dos principais teóricos do assunto, Philip Kotler (2203)  Marketing é um processo social e gerencial pelo qual indivíduos e grupos obtêm o que necessitam e desejam por meio da criação e troca de produtos e valores.”.
Ou seja, o marketing agencia essa "troca" entre produtor e consumidor, sendo que este primeiro, no caso do teatro, são os teatreiros e o último o público alvo. Se é uma troca, pressupõem-se um benefício mútuo. Kotler ainda define:

1.      O marketing procura o equilíbrio entre a oferta e a demanda.
2.      Marketing não é a arte de descobrir maneiras inteligentes de descartar-se do que foi produzido. Marketing é a arte de criar valor genuíno para os clientes. É a arte de ajudar os clientes a tornarem-se ainda melhores.
3.      Marketing é a função empresarial que identifica necessidades e desejos insatisfeitos, define e mede sua magnitude e seu potencial de rentabilidade, especifica que mercados-alvo serão mais bem atendidos pela empresa, decide sobre produtos, serviços e programas adequados para servir a esses mercados selecionados e convoca a todos na organização para pensar no cliente e atender ao cliente. (KOTLER, 2010, disponível em < http://merkatus.com.br/10_boletim/18.htm>)

Essas definições de Kotler são importantes para nos ajudar a chegar a alguns raciocínios, em especial ao item 2 supramencionado. Se "Marketing não é a arte de descobrir maneiras inteligentes de descartar-se do que foi produzido" (KOTLER, 2010), então eu não posso admitir estratégias que ludibriem o público alvo com o único objetivo de vender ingressos. O marketing precisa entender a essência do espetáculo e transportá-lo ao público alvo sem ruídos. Afinal, não adianta ter uma plateia cheia de gente insatisfeita, achando ter comprado "gato por lebre". Por isso, definir o público alvo é primordial para qualquer estratégia de divulgação. Você precisa identificar sua audiência para falar na língua dela em sua divulgação.
E é nesse sentido que procuro definir um marketing voltado ao teatro como um facilitador entre público e obra. Aliás, o conceito de mediador se aproxima muito do papel do marketing.

A noção diz respeito a um profissional ou instância empenhados em promover a aproximação entre as obras e os interesses do público, levando em conta o contexto e as circunstâncias. (PUPO, 2011, p.114)

Trata-se de um conceito bastante amplo, que inclui diversos profissionais e entidades que possuem como objetivo comum o estimulo ao acesso do público às obras artísticas. Para que essa mediação ocorra faz-se necessária um conhecimento aprofundado do mediado acerca da obra, de seu contexto, do artista e do público alvo. Ao mediador fica a incumbência de promover, além da simples presença do público na obra, o distanciamento necessário para que haja o abandono necessário à experiência artística.
Desgranges, por sua vez, citando o sociólogo Roger Deldime, define mediação como “qualquer ação que ocupe o que por alguns autores é chamado de terceiro espaço, aquele existente entre a produção e a recepção” (DESGRANGES, 2008, p. 76). (ABREU, 2015, p. 59)

É preciso destacar o lado “publicitário” de um mediador, quando este é o responsável por levar o público ao contato da obra. Se me permite o perlocutória, eu, que sou publicitário formado, sempre me vejo no papel desse mediador que precisa criar mecanismos que criem o interesse do público-alvo aos espetáculos teatrais do meu grupo. É uma das vertentes do trabalho de mediador, embora nenhuma delas possa garantir a experiência estética, já que esta depende de “princípios ligados ao sujeito (reflexividade, subjetividade e transformação) e à obra (exterioridade, alteridade e alienação)” (ABREU, 2015).
  
CONCLUSÃO

O desafio de levar a plateia até o teatro percorre diversas variáveis. O caminho entre tomar conhecimento de determinada peça, ter interesse, adquirir os ingressos e ir, efetivamente, na hora e local marcados podem ser considerados termos de um contrato entre público e produtores do espetáculo em questão.
O marketing e suas ferramentas podem auxiliar nesse papel de facilitar o acesso do público ao teatro, considerando todas as questões desde preço de ingresso, mercado, contexto do público alvo. Não se trata única e exclusivamente de criar uma campanha publicitária "chamativa" que pressupõe, muitas vezes, em um grande investimento financeiro. Mas sim, identificar o público de interesse, levar a seu conhecimento a ideia da peça, definir valores de ingressos acessíveis, efetivar a venda dos ingressos e mais: criar um canal de ouvidoria desse público para captar suas impressões acerca do evento.
Esses são alguns dos objetivos que se pretende com essa pesquisa e que precisa ser desdobrado em outros conceitos até ser efetivado em um estudo de caso que demonstre, como vias de fato, o marketing teatral aplicado na prática e seus resultados.
Faz-se necessário ainda conceituar: teatro, marketing tradicional, marketing digital, maketing de guerrilha, plano de comunicação, estratégia de comunicação publicitária, ideia criativa, planejamento de mídia e não mídia.
É necessário ainda, elaborar um formulário para ser entregue na porta do espetáculo durante as sessões de "Segredos de Liquidificador", questionando o público sobre quais meios de divulgação os levaram até o espetáculo, buscando assim, mensurar resultados das estratégias de marketing utilizado pelo espetáculo em questão.

Mapa Conceitual: Marketing Teatral

Para orientar minha pesquisa, elaborei um mapa conceitual com os caminhos que pretendo percorrer durante meu trabalho. Como todo mapa conceitual, o meu não tem a pretensão de ser entendido instantaneamente por qualquer pessoa, uma vez que o mapa conceitual faz sempre mais sentido para quem o elaborou. De todo modo, procurei elaborar um esquema de fácil assimilação, considerando que Marketing Cultural é a junção literal de "marketing + teatro". O próximo passo será conceituar cada ponto levantado. Vejamos:




quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Existe receita que garanta público nos espetáculos?

É inegável a importância do marketing como aliado nas produções teatrais, pois são as estratégias de divulgação que farão com que o público tome conhecimento das produções teatrais e sintam interesse em assisti-las.
Mas, existe receita que garanta público nos espetáculos? Não. Até mesmo porque essa questão depende de diversas variáveis e questões subjetivas. No entanto, meu intuito com essa pesquisa é explanar sobre as ferramentas do marketing, em especial o planejamento publicitário, para auxiliar a mediação entre público e espetáculo.

O desafio que as organizações e os marketeers culturais enfrentam é o de “tornar um produto cultural num objecto de desejo e fazê-lo chegar às pessoas que nunca o procurariam”2, escolhendo, para tal, os meios que mais retorno possam trazer à instituição. (DOMINGOS, 2010, p. 5)


Luminoso: Siga por aqui para um ótimo show!

Primeiramente, iniciei a pesquisa bibliográfica consultando publicações relacionadas ao tema marketing, teatro e cultura.
A maioria dos artigos que tratam diretamente do marketing voltado para promoção de shows e espetáculos teatrais que encontrei na internet são em inglês. Especial a Inglaterra produz bastante artigos sobre o assunto, o que me leva a perceber que esta matéria é tratada com mais naturalidade na Europa.

Pesquisa de referencial bibliográfico



ABREU, Glauber Goncalves. Experiência e Mediação em Teatro: abandonar-se para não abandonar. Brasília, 2015.

BUTAKKA, Eduardo de Freitas. O papel do Marketing Social na responsabilidade Social Corporativa; 2008; Trabalho de Conclusão de Curso; (Graduação em Comunicação Social) - Universidade Federal de Mato Grosso; Orientador: Benedito Dielcio Moreira.

CANCLINI, Néstor, Garcia. Culturas Híbridas: Estratégias para entrar e sair da modernidade/ tradução/2016 às 17:48)

DECKERS, Erik. 15 Social Media Tactics to Promote Your Upcoming Theatrical Show. Disponível em <http://problogservice.com/2011/08/30/15-social-media-tactics-to-promote-your-upcoming-theatrical-show/> Acessado em (14/11/2016 às 11:27).

DOMINGOS, Vanessa Sofia. MARKETING CULTURAL: ESTRATÉGIAS APLICADAS AO TEATRO. Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas Universidade Técnica de Lisboa. 2010.
GAZETA, Digital. “Marketing no teatro brasileiro”. Disponível em <http://www.gazetadigital.com.br/conteudo/show/secao/60/materia/115019/t/marketing-no-teatro-brasileiro> Acessado em (07/11/2016 às 21:38)

GOLDSTEIN, Dan. How to promote your show. Disponível em <http://www.dangoldstein.com/howtopromote.html> Acessado em (14/11/2016 às 9:51).

HUGHESY. Top 15 theatre marketing tactics. Disponível em <http://www.theatrepeople.com.au/top-15-theatre-marketing-tactics/> (14/11/2016 às 11:02).

KOTLER, Philip; KELLER, Kevin Lane. Administração de Marketing. 12.ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2006.

LOTT, Alcides Moura. Teatro em Mato Grosso – Veículo da dominação colonial. São Paulo/UFMT, 1986.

MABBITT, Clay. The Big List of Theatre Marketing Tactics. Disponível em <http://soldoutrun.com/theatre-marketing-tactics/> Acessado em (14/11/2016 às 10:28).

MOREIRA, Júlio César Tavares et al. Dicionário de Termos de Marketing. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2003.

MOURA, Carlos Francisco. O Teatro em Mato Grosso do Século XVIII. UFMT/Belém/ SUDAM, 1976.

PEREIRA, Julio Cesar. O Conceito de Cultura na Constituição Federal de 1988. IV
PÓVOAS, Lenine C. História da Cultura Mato-grossense. Cuiabá: Academia Mato-grossense de Letras, 1994.

PUPO, Maria Lúcia de Souza Barros. Mediação artística, uma tessitura em processo. Revista Urdimento N° 17 | Setembro de 2011.

SILVA, Jovam Vilela. Um breve relato da formação populacional (século XVII ao XX)./ Jovam Vilela da Silva – Cuiabá: KCM, 2006.


SILVA, Agnaldo Rodrigues da. Teatro Mato-grossense: História, Cultura e Ideologia. Disponível em <http://www.artistasgauchos.com/conexao/3/cap5.pdf> Acessado em (03/11/2016). Heloísa Pezza Cintão, Ana Regina Lessa; tradução prefácio a 2. ed. Gêneses. 4. ed. – São Paulo: Edusp, 2003.